Cresci numa cidade conhecida que sempre atraiu visitantes de todo o mundo. O meu grupo de amigos e eu conhecíamos cada pedra, cada portal e (sobretudo) cada gárgula e, para nós, todas elas tinham as suas histórias. Mas essas histórias eram muito diferentes das histórias que os visitantes conheciam e foi com eles que ficámos a saber, por exemplo, que o portal em arco com a estátua no topo foi iniciado no século XV e terminado no século XVI. Para nós, era o portão onde o Jim tinha uma vez feito chichi e tinha sido apanhado por um daqueles buldogues intrometidos com chapéus de coco e tinha levado uma pancada na orelha para acompanhar as suas botas molhadas.

Comer fora

Avançámos para a semana passada. Há anos que comemos fora em quase todos os restaurantes a uma hora de carro de casa. Há centenas deles, mas o mais próximo era aquele a que nunca tínhamos ido. É o único restaurante da nossa Freguesia e já tínhamos passado por ele inúmeras vezes a pé e de carro, mas há muito que não nos apercebíamos do seu objetivo, uma vez que não há placas de sinalização e não fazem publicidade. Foi uma observação casual do carpinteiro local, que tem a sua oficina nas proximidades, que nos levou a esclarecer sobre esta casa de aspeto vulgar, afastada da estrada. No entanto, já tinham passado cerca de dez anos desde que descobrimos esta pequena joia de informação e ainda nem sequer tínhamos pensado em ir lá para uma refeição. Até que, um dia, na semana passada, passámos por lá à hora de almoço e, em vez de irmos para casa e andarmos à procura de comida no frigorífico, estacionámos e entrámos pela primeira vez.

Ambiente ruidoso

É um daqueles sítios com eco. Sabe como é, com superfícies pontiagudas e betonadas que fazem o som saltar, de modo a parecer frágil e a chocalhar nos ouvidos. Os comensais à hora do almoço também eram bastante barulhentos, principalmente homens que pensam que a única forma de marcar uma posição e ganhar uma discussão é gritar mais alto do que a outra pessoa. Felizmente para nós, apesar de ter acabado de passar das 12h30, a hora de almoço já tinha terminado para os homens barulhentos e, por isso, rapidamente ficou muito mais calmo. Olhámos em volta e aproveitei a oportunidade para apresentar a palavra inglesa "dingy" à patroa.

O empregado de mesa era o proprietário e era um homem bastante rude. Informou-nos que havia peixe frito ao almoço ou, acrescentou num tom algo ameaçador, havia rojões - se não nos importássemos de esperar. Parecia quase uma ameaça e perguntámo-nos por que razão ofereceriam algo que não queriam que comêssemos. Foi tentador testar isto, pedindo o prato proibido, mas depois pensámos que ele conhece pessoas que nós conhecemos e é assim que começam as rixas nas aldeias, por isso pedimos o peixe, lembrando-nos virtuosamente que era sexta-feira. Aproveitámos a oportunidade para lhe perguntar porque é que não faziam publicidade - não havia sinais, nem uma pista de que era um sítio onde se podia comer. "Muito ocupado", foi a sua resposta brusca, e ele foi buscar o nosso pedido, obviamente sem vontade de se demorar a falar. Especulámos quanto tempo teríamos de esperar se tivéssemos insistido nos rojões e decidimos que, provavelmente, ainda não tinham apanhado o porco, por isso ainda faltava algum tempo.

Créditos: Imagem fornecida; Autor: Fitch O'Connell ;

Harmonizações diferentes

O peixe chegou rapidamente e trouxe consigo um pequeno quebra-cabeças. Foi acompanhado com freijão frade com salsa verde, o que era ótimo, uma vez que a salada de feijão frade combina bem com comida frita, mas também com uma porção de arroz, a variedade portuguesa Agulha. Achámos ambos estranho. Feijão frade com arroz? Não me pareceu correto. Algumas combinações na comida parecem bastante naturais - peixe e batatas fritas, queijo e massa, até feijão vermelho e arroz - mas salada de feijão frade num vinagrete de salsa com arroz quente? Não. No entanto, tentámos, nem que fosse para provarmos a nós próprios que tínhamos razão e que estava errado.

Por acaso, estávamos ambos com muita fome, por isso devorámos tudo, mas no processo também nos demos por satisfeitos por estarmos corretos. Não foi uma mistura feliz. Curioso, dissemos, como é que instintivamente sabíamos que não ia resultar. Lembrei-me de um velho amigo da família na Irlanda que tinha insistido, à sua maneira rude de Leitrimy, que toda esta história de ter pratos diferentes em pratos diferentes era uma perda de tempo e que combinar sabores diferentes não era para gente como ele. Começou a esvaziar a sopa, o jantar de costeletas de porco, a tarte de maçã e o leite-creme numa tigela e a misturá-los antes de os meter na boca, simplesmente para nos provar o seu ponto de vista. Bom homem, Jack, dissemos todos, mas mais tarde reparámos que ele nunca mais repetiu o truque. De qualquer modo, lá estávamos nós com um prato de salada de feijão e arroz que não combinava, mas que comemos na mesma, tal como o Jack.

Resumindo e concluindo, fomos ao restaurante mais próximo e saímos de lá com uma pequena história, o que é uma vitória.