Apesar de provocar um aumento temporário do valor líquido dos salários e pensões, o Governo reconheceu que a intenção é aproximar as retenções mensais de IRS das responsabilidades fiscais efectivas, reduzindo o habitual desfasamento que resulta em reembolsos.

O plano de redução do IRS ascende a 500 milhões de euros e será aplicado através de menores retenções mensais, compensando o excesso de impostos retidos de janeiro e julho com uma redução significativa do montante deduzido aos salários e pensões de agosto e setembro. Em outubro, um novo conjunto de tabelas voltará a aumentar as retenções, embora de forma menos acentuada do que em julho.

De acordo com os fiscalistas, o desagravamento fiscal verificado nos meses de agosto e setembro pode ultrapassar a correção necessária, podendo conduzir a excessos de retenção na fonte no primeiro trimestre do ano.

Luís Leon, fiscalista e fundador da empresa de consultoria Ilya, explica que, por exemplo, um trabalhador que ganhe um salário mensal bruto de 1.136 euros não terá de pagar IRS em agosto e setembro, mas, numa tabela normal, deveria ainda estar a pagar cerca de 3 euros por mês. "Para corrigir 42 euros de imposto pago a mais no primeiro semestre, o Governo está, no fundo, a devolver 180 euros", alertou. O impacto na reconciliação dos impostos em 2026 será notório, o que poderá reduzir drasticamente os fundos esperados ou mesmo fazer com que os contribuintes fiquem a dever dinheiro.

"O meu conselho é", sugeriu, "gastar 6 euros e poupar o resto".

"O reembolso em 2026 pode não ser igual ao dos anos anteriores", confirmou a secretária de Estado dos Assuntos Fiscais, Cláudia Reis Duarte, sobre este potencial impacto. Ainda assim, sublinhou que "isso é bom", porque as pessoas vão receber o dinheiro antecipadamente, em vez de ficarem à espera do reembolso. O objetivo, acrescentou, é alinhar o imposto deduzido ao longo do ano com o imposto final a pagar.

Um modelo semelhante foi aplicado em 2024, com deduções mais baixas em setembro e outubro, o que resultou numa surpresa generalizada com os baixos reembolsos em 2025.

Paula Franco, Bastonária da Ordem dos Contabilistas Certificados, fez eco deste alerta em declarações à SIC. "Os contribuintes foram apanhados desprevenidos com os valores dos reembolsos, esquecendo-se que em setembro e outubro tinham recebido muito mais salário líquido." Este ano, o cenário pode repetir-se, talvez agravando a quebra nos valores dos reembolsos.

Estas novas tabelas deverão ser aplicadas pelas entidades patronais a partir dos salários de agosto, mas o Governo está a permitir que sejam feitos ajustamentos até dezembro, em caso de atrasos. A mesma regra aplica-se às pensões processadas pela Segurança Social, que poderão não ser actualizadas a tempo do pagamento a 8 de agosto.

Simulações feitas pela PwC para o JN ilustram os efeitos a curto prazo das alterações: um trabalhador solteiro e sem filhos que ganhe 1500 euros vê o seu salário líquido subir de 1449 euros (em julho) para 1327 euros (em agosto e setembro), mas voltará a descer para 1154 euros em outubro - apenas mais cinco euros por mês do que antes do ajustamento.

Para os que auferem um salário bruto de 3000 euros, haverá um ganho líquido de 610 euros nos dois meses intermédios, mas em outubro, este aumento diminuirá para 12 euros por mês. A conclusão é clara: agosto e setembro serão meses de alívio excecional, mas os contribuintes devem preparar-se para surpresas desagradáveis nas suas declarações de rendimentos de 2026.